Por Victoria Hope
Pecadores (Sinners) de Ryan Coogler é um dos filmes mais aguardados do ano e é excelente dizer que a espera valeu a pena, pois esse é um dos melhores longas do ano, ao menos por enquanto! São tantas camadas que o filme explora, desde a segregação da era Jim Crow dos Estados Unidos, até temas como colorismo, imigração é claro, vampiros e seu folclore, além de temáticas sobrenaturais.
Na trama, tentando deixar suas vidas problemáticas (cheias de trambiques) para trás, dois irmãos gêmeos (intepretados de forma brilhante pelo Michael B.Jordan) retornam à sua cidade natal para recomeçar, apenas para descobrir que um mal ainda maior está esperando para recebê-los de volta.
Olhando à primeira vista, o filme parece que vai ser apenas mais uma história sobre a comunidade negra após a recente abolição da escravatura, mas muito pelo contrário, o filme já logo nos primeiros segundos destrói completamente essa ideia ao apresentar uma cena simples, mas cheia de simbolismos, onde a audiência acompanha um jovem rapaz sangrando voltando para sua cidade com um violão destruído. Isso já é uma pequena a amostra sobre os temas sobrenaturais e misteriosos que vão tomar conta da narrativa do início ao fim.
A temática da música como salvação e ao mesmo tempo, a perdição de um dos protagonistas, o Sammie, é genial e acrescenta ainda mais nuances nessa história que essencialmente fala sobre a liberdade negra em vida (e até após a morte). Assimilação cultural e influência da comunidade negra em diversos aspectos da nossa sociedade sâo o principal tema, até mesmo quando a temática vampiresca toma conta.
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Cena de 'Pecadores'/ Foto: Warner Bros. Pictures |
O mais fascinante de 'Pecadores' não é apenas centrado no fato de Michael B Jordan interpretar dois personagens tão distintos, mas também em toda a atmosfera do longa, mostrando como as classes minoritátias se uniam na época pós Jim-Crow para sobreviverem, incluindo os imigrantes irlandeses, também conhecidos por serem deixados à margem da sociedade em sua chegada à América.
Todos estão acostumados com centenas, milhares de filmes sobre vampiros, mas nunca se viu um filme de vampiros abordar as criaturas noturnas e sangrentas dessa forma antes. Sem cair em território de spoilers, foi muito fascinante ver a forma em que o diretor Ryan Coogler apresentou as criaturas através de outra classe 'minoritária' que chegou aos Estados Unidos na mesma época da segregação e que assim como a comunidade negra, tinham terras para cuidar e essas terras nunca eram suas e que assim como a comunidade negra, tinha e ainda tem uma ligação profunda com a música, com a dança e com a honra de suas tradições, mas é nítido que o tratamento da sociedade era diferente para ambas as comunidades.
Os figurinos da vencedora do Oscar Ruth E.Carter são um show à parte, conseguindo traduzir muito bem a vivência da sociedade norte americana durante a década de 30 e para deixar o filme ainda mais especial, a direção de fotografia fantástica (e em alguns momentos sensual) da brilhante diretora de fotografia Autumn Durald Arkapaw, ajuda na imersão dessa história belíssima, mesmo que o roteiro vez ou outra tome alguns "tropeços" durante o desenvolvimento.
Existe uma cena específica relacionada ao poder da música que faz os olhos se encherem de lágrimas, não apenas pelo blues emocionante que toca ao fundo, mas sim por essa ser uma sequência que não apenas fala, mas mostra ancestralidade, respeito por nossas raízes, de onde viemos e para onde iremos e a final, será que os vilões da história são as criaturas das trevas ou as pessoas comuns, de classes privilegiadas, que não tem nada no coração além de ódio por tudo o que é diferente e por tudo o que ameaça o status quo?
NOTA: 9.5/10