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[Review] Superman é uma carta de amor aos fãs de quadrinhos

 

Por Victoria Hope

Superman de James Gunn sem dúvida alguma é um dos filmes mais aguardados desse ano e com razão, afinal, com ele,. chega a promessa de uma nova construção de universo cinematográfico da DC e felizmente, esse pontapé inicial começou muito bem! 

O novo filme do Homem de Aço entrega tudo o que os fãs dos quadrinhos sempre quiseram ver nas telas; uma versão muito próxima de Christopher Reeve e Tom Welling, mas ainda assim, totalmente original, trazendo aquele ar de esperança que muitos ansiavam por ver há anos. 

Não é exagero dizer o novo filme de Superman  é um dos melhores e não por acasop, resgata diversos clássicos, desde a trilha sonora icônica à personagens icô nicos como Krypto entre outros. É incrível como James Gunn mais uma vez consegue entregar uma obra equilibrada, respeitando o passado e ao mesmo tempo, reiventando o personagem de forma inteligente, tocando em temas relevantes não apenas para os EUA nesse momento, como também para o mundo.


Superman / Foto: Warner Bros. Pictures

Nesses últimos anos, a internet foi tomada por um conflito sem fim entre fãs do Superman de Zack Snyder e fãs de James Gunn, como se na indústria não houvesse espaço para diversas interpretações do mesmo personagem, porém, outros temas também vieram à tona como discursos políticos, que sempre estiveram presentes na construção de grande parte, se não, de todos os personagens de quadrinhos desde os primórdios até hoje.

E é exatamente por esse motivo que o novo filme de Superman é tão essencial, porque ele não apenas toca em temas políticos extremamente necessários, como também relembra ao público de que ainda há esperança, trazendo uma mensagem de que a bondade e fazer o certo são os melhores caminhos a se seguir, mesmo quando o mundo diz o completo oposto.

Aqui no filme, o elenco é completamente afiado, conduzido por David Corenswet que está excelente no papel de Clark Kent e Superman, com todos os trejeitos de garoto do interior, mas ainda assim, representando o arquétipo do herói falho; aquele que erra, como todos os humanos e isso é bem admirável! Rachel Brosnahan está impecável como a excelente jornalista Lois Lane e é claro, um dos destaques do filme fica por conta de Nicholas Hoult, que entrega aqui uma das performances definitivas de Lex Luthor.


Superman / Foto: Warner Bros. Pictures

Até mesmo personagens secundários, com destaque para o Senhor Incrível de Edi Gathegi e Krypto, entregam momentos que parecem ter saído diretamente dos quadrinhos e é isso que faz desse filme ao tão diferente do que a DC tem entregado nos últimos anos, pois Gunn não tem medo de referenciar quadrinhos, muito pelo contrário, ele é justamente o tipo de diretor que entende que é preciso suspender a descrença para que filmes assim funcionem.

Superman não é apenas ultra colorido como os quadrinhos, mas também é um filme extremamente positivo, que encanta e inspira em tempos tão difíceis. Em filmes anteriores, o diretor já havia demonstrado saber trabalhar com muitos personagens em tela e Superman funciona justamente por conta disso; toda a construção desse novo universo cinematográdica é feita com cuidado, mas ao mesmo tempo, com muita leveza.

A trilha sonora, acompanhada de belíssimas cenas de ação e muitos momentos emocionantes, principalmente entre Clark e seus pais, é o que faz desse filme algo tão especial e torna essa uma experiência que precisa ser vista de preferência nos cinemas, na maior tela possível. Esse é o Superman que o mundo precisa!

NOTA: 8.5/10

[Review] Pecadores de Ryan Coogler é um dos melhores filmes do ano!

 

Por Victoria Hope

Pecadores (Sinners) de Ryan Coogler é um dos filmes mais aguardados do ano e é excelente dizer que a espera valeu a pena, pois esse é um dos melhores longas do ano, ao menos por enquanto! São tantas camadas que o filme explora, desde a segregação da era Jim Crow dos Estados Unidos, até temas como colorismo, imigração é claro, vampiros e seu folclore, além de temáticas sobrenaturais.

Na trama, tentando deixar suas vidas problemáticas (cheias de trambiques) para trás, dois irmãos gêmeos (intepretados de forma brilhante pelo Michael B.Jordan) retornam à sua cidade natal para recomeçar, apenas para descobrir que um mal ainda maior está esperando para recebê-los de volta.

Olhando à primeira vista, o filme parece que vai ser apenas mais uma história sobre a comunidade negra após a recente abolição da escravatura, mas muito pelo contrário, o filme já logo nos primeiros segundos destrói completamente essa ideia ao apresentar uma cena simples, mas cheia de simbolismos, onde a audiência acompanha um jovem rapaz sangrando voltando para sua cidade com um violão destruído. Isso já é uma pequena a amostra sobre os temas sobrenaturais e misteriosos que vão tomar conta da narrativa do início ao fim.

A temática da música como salvação e ao mesmo tempo, a perdição de um dos protagonistas, o Sammie, é genial e acrescenta ainda mais nuances nessa história que essencialmente fala sobre a liberdade negra em vida (e até após a morte). Assimilação cultural e influência da comunidade negra em diversos aspectos da nossa sociedade sâo o principal tema, até mesmo quando a temática vampiresca toma conta.


Cena de 'Pecadores'/ Foto: Warner Bros. Pictures

O mais fascinante de 'Pecadores' não é apenas centrado no fato de Michael B Jordan interpretar dois personagens tão distintos, mas também em toda a atmosfera do longa, mostrando como as classes minoritátias se uniam na época pós Jim-Crow para sobreviverem, incluindo os imigrantes irlandeses, também conhecidos por serem deixados à margem da sociedade em sua chegada à América. 

Todos estão acostumados com centenas, milhares de filmes sobre vampiros, mas nunca se viu um filme de vampiros abordar as criaturas noturnas e sangrentas dessa forma antes. Sem cair em território de spoilers, foi muito fascinante ver a forma em que o diretor Ryan Coogler apresentou as criaturas através de outra classe 'minoritária' que chegou aos Estados Unidos na mesma época da segregação e que assim como a comunidade negra, tinham terras para cuidar e essas terras nunca eram suas e que assim como a comunidade negra, tinha e ainda tem uma ligação profunda com a música, com a dança e com a honra de suas tradições, mas é nítido que o tratamento da sociedade era diferente para ambas as comunidades.

Os figurinos da vencedora do Oscar Ruth E.Carter  são um show à parte, conseguindo traduzir muito bem a vivência da sociedade norte americana durante a década de 30 e para deixar o filme ainda mais especial, a direção de fotografia fantástica (e em alguns momentos sensual) da brilhante diretora de fotografia Autumn Durald Arkapaw, ajuda na imersão dessa história belíssima, mesmo que o roteiro vez ou outra tome alguns "tropeços" durante o desenvolvimento.

Existe uma cena específica relacionada ao poder da música que faz os olhos se encherem de lágrimas, não apenas pelo blues emocionante que toca ao fundo, mas sim por essa ser uma sequência que não apenas fala, mas mostra ancestralidade, respeito por nossas raízes, de onde viemos e para onde iremos e a final, será que os vilões da história são as criaturas das trevas ou as pessoas comuns, de classes privilegiadas, que não tem nada no coração além de ódio por tudo o que é diferente e por tudo o que ameaça o status quo? 

NOTA: 9.5/10

[Review] Deadpool e Wolverine

 

Por Victoria Hope

Começo essa crítica dizendo que sou muito fã de Deadpool tanto que fui chamada até mesmo pela Disney pra falar sobre o meu amor pelo personagem na série de vozes da diversidade da Disney e por esse motivo, por amar esse personagem, escrevo pela primeira vez uma crítica em primeira pessoa por aqui. 

Como fã e também colecionadora dos quadrinhos, eu estava com altas expectativas para Deadpool e Wolverine após o excelente Deadpool 2 e fico feliz em dizer que o filme superou minhas expectativas e entregou um projeto que vai agradar muito os fãs de ambos os personagens. 

O filme me surpreendeu por que foi bom de muitas formas, mas é claro que eu também tenho muitas críticas que vou falar mais pra frente em termos de caracterização do personagem e roteiro. Esse filme é o verdadeiro team up que estava faltando e eu adoraria que a Marvel trouxesse mais team ups pra essa nova fase, pois vimos que isso funciona bem, vide Falcão e Soldado Invernal.

Tanto o Ryan Reynolds quanto o Hugh Jackman tem uma química incrível e eu adoro que pras piadas do filme funcionarem, os dois tem que tipo jogar a bola pro outro cortar e isso funciona muito bem em tela e é um dos trunfos que eleva o filme, já que pessoalmente acredito que essa história não funcionaria caso os atores não estivessem tão próximos. 

Wolverine e Deadpool em cena / Foto: Disney

Em um comentário mais geral, eu adorei todas participações especiais do filme, porque esse é o tipo de fanservice que a gente  já espera da Marvel, principalmente de Deadpool, agora que ele está na Disney e pode brincar a vontade todos os títulos e personagens dos estúdios, mas é aí que começa o problema...

O filme focou tanto no fanservice que em alguns momentos, esqueceu de desenvolver o roteiro, mas mesmo assim, acredito que se compararmos esse roteiro com a escrita de quadrinhos team up de Deadpool, então esse tipo de dinâmica funciona bem, porém o texto poderia sim, ter sido melhor desenvolvido.

A trilha sonora do filme é um dos pontos mais altos de Deadpool e Wolverine, já que como boa millenial que sou, simplesmente amei ouvir Avril Lavigne ,N'sync, Fergie e outros hits tocando no filme e vale ressaltar que a abertura musical do filme é de longe uma das aberturas mais criativas e incríveis da última década no MCU, tudo isso graças ao excelente trabalho do professor de dança Nick Pauley, que carinhosamente ganhou o apelido de Dancepool.

Emma Corrin no papel da vilã Cassandra Nova / Foto: Disney

Voltando à trama, falando sobre a vilã Cassandra Nova, acredito que Emma Corrin fez um excelente trabalho, em alguns momentos, combinando seu humor com o de Ryan Reynolds, porém em alguns momentos, senti que Cassandra seria a vilã perfeita em outro universo da Marvel, como por exemplo, em um filme mais sério voltado apenas aos X-Men.

Em um comentário mais geral, adorei ver todos os personagens antigos do Wade, desde Blind Al à Yukio e Dopinder, apesar de ter sentido falta da Domino em cena. Alguns fãs sentiram que a trama dos personagens que formam a família de Deadpool ficaram meio 'jogados' na trama, mas eu acredito que a aparição deles foi importante pra mostrar a motivação real por trás do personagem titular querer se transformar em uma pessoa melhor e em um herói.

Mas nem tudo são flores, pois minha crítica maior vai para o queerbaiting. Eu entendo que a geração mais nova se contente com fragmentos de representatividade a estilo série do Loki para o Disney+,  mas é preciso saber quando estão rindo com você e de você e essa nuance é totalmente perdida por parte do público.  

Tanto nas HQs, quanto no filme, vemos várias cenas que supostamente mostram a pansexualidade do Wade Wilson abertamente, mas todas essas histórias param por aí, no supostamente mesmo, já que a orientação sexual dele é sempre tratada como piada.

Deadpool e Wolverine / Foto: Disney

 'Ah mas vick, o Deadpool faz piada com tudo', É mesmo? Me mostre algum momento dos três filmes de Deadpool onde o romance dele com a Vanessa foi tratado como piada e não, a cena da cinta não conta, já que ele não está tirando sarro do romance deles. Me mostre quando ele não levou a sério o luto por ter que terminar com a Vanessa?

Muita gente defendeu Loki porque dizem 'pessoas bissexuais não precisam aparecer em relações com pessoas do mesmo gênero para serem consideradas LGBTQIAP+ e eu concordo, porém estamos falando de mídia, de ficção, onde o subtexto nem sempre funciona e onde a representatividade TEXTUAL  e VISUAL é muito importante.

Claro que em Deadpool e Wolverine, vemos o subtexto enorme na cena do carro entre o Wade e o Logan e temos também diversas cenas onde o Wade está cantando e admirando homens, mas isso tudo é tratado com tom de piada, mas é claro que isso não apaga que ele tenha personagens queer em tela, o que tmbém é importante, já que temos Wade,  que é pansexual, Shatterstar, que é um homem gay nos quadrinhos, Emma corrin que na vida real é não- binário,  além de Negasonic e Yukio que são lésbicas.

E pra fechar, outra crítica que eu tenho é o humor sexista que não estava presente nem nas HQs, nem nos dois primeiros filmes de Deadpool, mas esteve aqui em Deadpool e Wolverine. Aqui, parece que virou piada chamar homens cis de mulherzinha; a gente vê personagens fazendo isso o filme inteiro, o que apenas endossa essa visão dos 'fãs' que disseram que o filme é 'anti-lacração', ideia que não poderia estar mais longe da realidade que o filme apresenta. 

Com esses pontos negativos tirados da frente, posso voltar a dizer como esse filme foi importante para os fãs de quadrinhos, afinal,  é um filme que respeita os quadrinistas que fizeram do Deadpool ser o que ele é. Não podemos esquecer de Gail Simone, Gerry Duggan, Joe Kelly e todos os nomes responsáveis por ter trazido a possibilidade dos filmes o Deadpool existirem. Deadpool e Wolverine é um filme que honra os quadrinhos da Marvel, que vai te fazer sorrir, chorar, sentir nostalgia e saber que a partir de agora, essa nova era do MCU vai ser muito mais fiel aos quadrinhos do que qualquer outra era. 

NOTA: 8.5/10

[Review] The House (Netflix)

 16/01/2022

Por Victoria Hope

A mais nova animação stop-motion original da Netflix, 'The House' é um respiro para o gênero e se faz necessária, principalmente em tempos de isolamento. Na antologia, conhecemos três distintas histórias, dirigidas por três dos maiores animadores stop motion contemporâneos, Emma de Swaef & Marc James Roels, Niki Lindroth von Bahr e Paloma Baeza.

Nessas três histórias, os visionários diretores contam a história da relação de três personagens diferentes em uma mesma casa, ao longo das eras, passando desde o passado na era Vitoriana ao possível futuro, que pode ser mesmo durante ou após 2022. 

Com a proposta de horror, mas erroneamente divulgado como humor dark, a antologia propõe uma nova visão ao universo stop motion, provando que o gênero, unido ao terror e drama em uma trama voltada para adultos, funciona tão bem quanto em animações mais divertidas voltadas ao público infantil. 

Capítulo 1 / Foto: Netflix

No capítulo 1 dirigido pelo casal Emma de Swaef e Marc James Roels, acompanhamos a vida de uma família humilde da era vitoriana, em 1800, que apesar do pouco que tem, vivem uma vida de harmonia, até a mãe de Raymond, que é nosso protagonista, chegar e humilhar o filho, dizendo que ele é tão pior quanto seu pai, já que segundo sua mãe, o mais velho tinha problemas com bebida.

Isso é o suficiente para que o  Raymond estremeça e caia na bebedeira noite a fio, até que misteriosamente, ao andar sem rumo pela floresta, ele encontra uma misteriosa carruagem e a partir daí, sua vida e a vida de sua família mudam para sempre. 

Simplesmente adorei a metáfora de materialismo dessa primeira parte da antologia e a metáfora do materialismo e como rapidamente, por pura ganância, os pais desistiram de sua antiga casa para se encantarem por essa nova. Nota-se que Raymond tomou todas as decisões sem consultar a família, tudo o que ele fez foi por si mesmo e até a nova casa demonstra, com as cores azuis da parede e mesa distante, o quanto os pais foram se afastando das filhas e ficando cada vez mais gananciosos.

A metáfora da riqueza e luxo são pontuais, afinal, existem muitas marcas hoje que pessoas abastadas consomem apenas por status e foi este mesmo status que causou a ruína dessa família. Antes eles tinham um lar, mesmo que humilde, agora eles só tem uma casa e nada mais. 

Capítulo 2 / Foto: Netflix

[TW: Dissociação, depressão, insetos e despersonalização] O Capítulo 2, foi talvez um dos mais fortes e surreais da antologia, com direção de Niki Lindroth von Bahr. Na trama, acompanhamos a vida de um rato que é desenvolvedor e está tentando vender uma mansão, por meio de fraude imobiliária. 

Foi genial a forma em como mostraram a deterioração da saúde mental do protagonista nessa segunda parte e eu particularmente vi a infestação de insetos na casa como uma metáfora própria saúde mental dele piorando cada vez mais. 

Ele inventa essa vida fictícia pra ele, que não real não passa de uma fraude imobiliária, ele inventa na cabeça que tem uma relação amorosa, quando na verdade está importunando o próprio dentista, chamando ele por apelidos carinhosos. Tudo isso é uma ilusão e não sabemos se na verdade, tudo aquilo é real, ou se o personagem está se dissociando. 

Acredito que a invasão de ratos-inseto na casa dele, mostra apenas o agravamento da questão de saúde mental do protagonista e gosto de imaginar que ele acabou indo pro hospital por conta de um surto psicótico ou de um ataque de pânico. 

Ao final, vemos os insetos (a saúde mental deteriorada dele), o dando boas vindas calorosas e também vemos ele passando por uma despersonalização mais uma vez, esquecendo completamente de quem ele é. Ou será que ele sempre foi aquilo que vemos no final? Seria aquele o verdadeiro 'eu'? 

Capítulo 3 / Foto: Netflix

Já o capítulo 3, que encerra a antologia, foi um dos que mais me pegou. Com direção de Paloma Baeza e vozes de Helena Bonham Carter, Mia Goth e Cillian Murphy, acompanhamos a vida de uma caseira que aluga a mansão para pessoas de fora, mas a mansão atualmente está coberta por água e sumindo cada vez mais. 

Esse aqui me pegou, eu literalmente chore no final da história porque me identifiquei demais com a protagonista, Rosa. Acho que as metáforas nesse são bem mais óbvias: A protagonista não queria deixar seu passado, ela estava presa à casa e não queria seguir em frente. 

Acredito que o objeto 'A Casa' é uma extensão da mente dos protagonistas, ou seja, se a casa representa o estado mental dela, Rosa estava quebrada por dentro, precisava mudar, mas ela tinha muito medo. Mesmo com ela tentando esconder as falhas com o papel de parede bonito, nada funcionava, mas ela queria muito focar na tal reforma, porque ela se sentia segura assim, já que pensar na reforma a fazia 'esquecer' que a casa estava sendo inundada. 

Ela precisou de três diferentes pessoas ( que talvez nem estejam mais vivas), pra seguir em frente e mesmo assim, quando ela triunfa, ela leva a casa junto com ela, porque percebe que ela não precisa se desprender totalmente de seu passado, ao invés disso, ela pode levar uma parte dele pra se lembrar de quem é, esse vai ser um fardo que vai seguir ela, mas não é por isso que ela precisa criar raízes e não sair do lugar. Levar a vida com leveza e ter um pouco mais de fé, são as lições que a protagonista aprende ao longo da história, pois mesmo com medo, ela vai rumo ao desconhecido. 

[Review] Midnight Mass

Por Victoria Hope

Mais uma vez Mike Flanagan dilacera corações e entrega um dos melhores projetos de terror dramáticos do ano em sua terceira produção com a Netflix. A minissérie Missa da Meia-Noite (Midnight Mass) é de longe a maior obra prima do diretor, que sem medo, mergulhou em aspectos mais sombrios de sua vida para contar uma história que subverte e renova totalmente o gênero.

Para recordar, o diretor e roteirista Mike Flanagan, é criador de outras duas produções aclamadas do streaming, como A Maldição da Residência Hill (The Haunting of Hill House) e A Maldição da Mansão Bly (The Haunting of Bly Manor).

Em Missa da Meia-Noite, acompanhamos a história dos habitantes de uma pequena ilha isolada e falida, que ao receberem uma visita inesperada de um jovem padre, passam a testemunhar milagres repentinos e aparições quase que 'divinas' nos arredores da ilha. 

Missa da Meia-Noite / Netflix 

Recheada de monólogos poderosos e momentos de introspecção, a série tem uma propõe uma análise sobre fé, morte, vida e outras questões filosóficas que nos fazem questionar, como humanos, qual é o nosso verdadeiro propósito. 

Talvez parte do público não consiga acompanhar esses diálogos, pois todos são muito longos e carregam um peso enorme, mas acredito que Missa da Meia-Noite é uma série que precisa ser assistida no momento certo na vida de quem está assistindo. É preciso estar no 'clima' para embarcar. 

Momentos de angústia, são postos à mesa em monólogos que fazem o público refletir, tudo isso graças ao trunfo do excelente roteiro de Mike Flanagan. Em momentos, a dor do criador da série é palpável., já que próprio comentou em entrevista ao Bloody Disgusting, que Missa da Meia-Noite, foi quase como uma terapia, que ele estava escrevendo há mais de 10 anos enquanto lutava para estar sóbrio.

Xerife Hassan e Joe / Netflix 

A minissérie toca em muitas feridas, principalmente relacionadas a religião e política, que nesse exato momento, também se cruzam na vida real. Flanagan aponta sem medo para a influência que valores retrógados tem em pessoas não informadas e como muitos estão dispostos a acreditar em mentiras, para dormir 'bem' a noite ou acreditar que são melhores que os outros. 

Joe, um dos personagens mais trágicos da trama, é um dos grandes exemplos das pessoas que a sociedade não quer enxergar e que mesmo que de forma indireta, desejam seu extermínio. Riley Flynn também apresenta ameaça, pois antes é tido como um exemplo da comunidade religiosa da ilha, mas após causar uma morte acidental de uma adolescente, passa a ser visto como mais um pária.

É incrível como Missa da Meia-Noite trabalha esses personagens renegados pela sociedade religiosa, como por exemplo, o xerife Hassan, que deixou da cidade grande para fugir do racismo e islamofobia, para ao final, acabar passando pelo mesmo na pequena ilha, assim como também a Dra. Sarah, que não é bem vinda na igreja por lésbica e Erin, por ser uma mãe viúva. Curiosamente, são esses personagens 'excluídos' pela sociedade, que ao final, são os verdadeiros heróis na trama. 

Leeza, filha do Prefeito e Ali, filho do Xerife / Netflix

Falar mais sobre o enredo seria um spoiler enorme e com certeza estragaria a experiência de quem ainda vai assistir a minissérie, mas um dos principais trunfos de Missa da Meia Noite, é a subversão total de temas explorados incansavelmente no cinema de terror e ouso dizer que a série é definitivamente um dos trabalhos mais 'Stephen King', sem ser obra do autor, que já vi. 

Vale dizer que é uma produção bem slowburn, ou seja, leva tempo para a trama engatar, mas todos esses momentos, todos os diálogos, fazem o ápice valer a pena, com um plot twist que ninguém esperava e que quando começa, com certeza fará você perder o fôlego.

Não existem performances fracas na série, aliás, todo o elenco está impecável, com destaques para Hamish Linklater, que interpreta brilhantemente o Padre Paul Hill e Samantha Sloyan, que entrega absolutamente tudo com a detestável carola Bev Keane. Sem dúvidas ambos mereciam indicação ao Emmy por esses papéis. 

Missa da Meia-Noite está disponível na Netfflix 

Quando subtexto e migalhas de representatividade dominam o entretenimento

 

Por Victoria Hope

Entra ano, passa ano e diversos fandoms continuam sobrevivendo de migalhas de representatividade, mas nunca a representatividade em questões raciais,  LBGBTQIA+ ou PCD na mídia. 

Quando dizemos a máxima de que o entretenimento emula a vida real, isso é fato, mas quando falamos sobre filmes, séries, livros e mídias mistas, a nuance -NÃO - deveria existir. "Ah, personagem 'x' disse que é bi, então tudo bem, ele não precisa aparecer flertando com homens e mulheres, nem precisa estar em um relacionamento com um homem ou mulher para ser canonicamente bi". 

E isso é fato na vida real, mas na ficção, é aí que que argumentos caem por terra. Por mais que o entretenimento tente transferir a vida real pras telas com maior fidelidade possível, ainda estamos falando de FICÇÃO, ou seja, ela precisa deixar NÍTIDA a mensagem, pois nem sempre a subjetividade é entendida pelo público médio.



Atuo na área de comunicação de massa, pesquisa e cool hunting faz uns anos, então posso dizer que minha área de especialização é o estudo do comportamento do consumidor de entretenimento, por isso, sempre interajo com o público online. 

Nesse sentido, posso fazer a famosa 'carteirada', como costumam dizer online, pois, quando falamos em mídia, não há espaço pra subjetividade; não quando a sociedade do mundo real ainda tem dificuldades de entender esses conceitos mais básicos. 

Se a nossa sociedade ainda tem dificuldade de aceitar bissexualidade como algo 'real' ainda hoje, tanto na comunidade hetero-cisnormativa, quanto dentro da própria comunidade LGBTQIA+, como é que espera-se que os consumidores médios entendam a importância dessa representatividade?




Falemos em Loki. A série, desde seu anúncio, contou com relatos de diretores e produtores se auto congratulando pela representatividade bissexual na série, mas quando observei vídeos de reações sobre a produção no youtube, notei que o público médio sequer notou a cena e que a frase do protagonista 'Um Pouco dos dois', ao mencionar suas preferencias em namoro, poderiam ser facilmente editadas para entrar em países onde a censura de identidades LGBTQIA+ ainda segue firme.

E quando falamos em representatividade racial então? Qual mensagem a mídia está mandando para as crianças, principalmente, quando em um filme ou série, o personagem negro as vezes é o único sozinho daquele núcleo, ou quando representa apenas criminosos? Que código você está sendo passado para crianças? E quando o cinema e a TV utilizam atores árabes para representar apenas vilões? E quando utiliza personagens asiáticos como exóticos, passivos ou brinquedos sexuais?

Isso não é representatividade. Isso é representatividade performática, que é basicamente, adicionar representatividade mínima, ou errada o suficiente para não ofender as sensibilidades do público consumidor mais conservador. 



Outro exemplo que enfurece fãs de quadrinhos, é a representação do personagem Clint Barton no universo cinematográfico da Marvel. Nos quadrinhos, Hawkeye é surdo e partir de Life As a Weapon, aprendemos que ele passou a perder a audição na infância após abusos físicos que sofreu do pai. 

Nos quadrinhos a partir dessa fase de Matt Fraction, Clint passa a utilizar língua de sinais, aparelho auditivo e aprende a fazer leitura labial. A surdez de herói é extremamente importante para o personagem, pois ele é o arqueiro mais habilidoso do universo 616, ou seja, ele consegue sentir a presença de inimigos a quilômetros de distância, porque ele treinou a vida toda pra aprender a aguçar seus outros sentidos e ser um bom agente. 

Na época de lançamento dos primeiros Vingadores, Jeremy Renner, que interpreta o herói filmes, não quis interpretar o personagem usando aparelho auditivo, mas sabem qual importância disso pro Hawkeye dos quadrinhos? 

Muitas crianças surdas passaram a se identificar e tem relatos da época, de mães, relataram em entrevistas que os filhos tinham vergonha de usar o aparelho auditivo antes, até verem o herói favorito deles usando nos quadrinhos. Você tem noção do peso disso? Representatividade real, é disso que estamos falando. 

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Estamos em 2021 e ninguém é pombo para se alimentar de migalha em migalha. Não aceitemos pouco, afinal, o mundo é diverso e se a mídia se propõe a ser o espelho da realidade, que ela seja um espelho por inteiro.

[Review] O Tigre Branco

 

Por Victoria Hope

O Tigre Branco da Netflix é talvez uma das adaptações que eu mais esperava assistir em 2021. Se assim como eu, você também já se deparou com a famosa capa de livro com um tigre branco rolando pelas livrarias nacionais desde 2015, certamente também se surpreendeu com a notícia de que esse best seller indiano de Aravind Adiga

Com uma temática muito necessária e relevante para os dias atuais, O Tigre Branco, dirigido por Ramin Barahni, pode ser considerado o 'Parasita' e 'Que Horas Ela Volta' da Índia, tratando com humor sarcástico, a desigualdade social do país pelo ponto de vista de um jovem que pertence a casta baixa indiana.

Na trama, conhecemos a história de Balram Halwai (Adarsh Gourav), um jovem indiano que vive em um dos bairros mais necessitados da Índia e sonha em um dia ser bem sucedido com o emprego de motorista. Ao longo da trama, o protagonista narra os acontecimentos de sua vida com muita sinceridade e até mesmo inocência.

O Tigre Branco / Netflix

A todo momento, nos diálogos trocados entre Balram e os outros personagens, principalmente seus patrões, Pinky (Pryanka Chopra-Jonas) e Ashok (Rajkummar Rao), percebe-se a diferença gritante de hábitos que separam as classes na Indía.

No começo, Balram ainda tem uma visão muito otimista sobre o novo emprego, afinal, segundo o próprio, o desejo de servir uma família rica, estava enraizado em sua mente desde a infância. Vemos Balram vivendo uma infância relativamente 'positiva', apesar de sua família viver na 'miséria', mas é justamente por conta disso, que o garoto se esforça para se destacar como melhor aluno da sala, mas no momento em que ganha uma bolsa, a necessidade de sobreviver, faz com que ele deixe a escola para começar a trabalhar.

Apesar do filme seguir o mesmo clichê de mostrar extremos da riqueza e da pobreza na Índia, sem mostrar as nuances de classe, o filme acaba por apresentar uma nova visão à essa divisão, brincando com ironia e expondo preconceitos que até nós mesmos, de países ocidentais, carregamos.

O Tigre Branco / Netflix

Um dos ápices do filme, é quando Balram finalmente entende o que está acontecendo e finalmente se revolta com tantas injustiças, mas é a partir desse momento que o filme se transforma, com um plot twist que era esperado, mas que vem de inesperada, graças à atuação impecável  e nada previsível de Adarsh Gourav, que carrega sozinho, toda a trama, com humor, ironia, raiva, tristeza e nos faz imergir ainda mais na experiência de Tigre Branco.

A transformação do personagem em um dos homens mais poderosos da Índia é incrível de se ver, mas ao mesmo tempo assusttadora, enquanto o protagonista segue narrando todos os fatos, mantendo sua verdade do início ao fim. Por mais que ele se torne um 'vilão', em nenhum momento ele perde sua essência, afinal, tudo estava ali desde o começo: O desejo por vingança e o sonho de se tornar poderoso.

Balram sempre foi o Tigre Branco. Desde a infância, com sua frustração pela vida miserável de sua família e pelo roubo do pouco que tinham por ricos corruptos, até as injustiças que aconteciam com a população do 'galinheiro'. Apenas em sua transformação, percebemos que ele sempre foi um Tigre à espreita, sonhando com o dia em que estaria livre da gaiola. 

O Tigre Branco / Netflix

'O Tigre Branco', apresentou um dos protagonistas mais tridimensionais que eu já vi em qualquer mídia. Balram não é totalmente bom ou ruim, ele é humano, tem sonhos, desejos, alegrias, mas também muitas tristezas. Você não necessariamente se identifica com ele, mas muito do que acontece com ele, pode ou não ter acontecido com você e isso apenas atiça a sua sede pela vingança do Balram.  

Na parte mais técnica, ainda faltam algumas coisas para ser considerado um filme de gênero que pode concorrer ao Oscar, mas é definitivamente um novo passo para divulgar o cinema indiano para o mundo e criar produções cada vez mais diversas dentro do contexto de Hollywood. 

Não é um filme fácil de ser digerido e por ser longo demais, cerca de duas horas, a experiência acaba se tornando maçante em alguns momentos, mas não deixa de ser uma história interessante com um desfecho para lá de satisfatório. 

Nota: 8.5 /10

Lovecraft Country e a importância de sua simbologia

 

Por Victoria Hope

Quando a realidade é mais assustadora do que a fantasia e ficção, séries como Lovecraft Country se mostram necessárias e essenciais para entender o que aconteceu no passado e o tocar na ferida de questões essenciais para a sobrevivência de uma comunidade inteira.

Baseada na obra de Matt Ruff, Lovecraft Country é a adaptação de um best seller de literatura que subverte completamente a visão de H.P Lovecraft, o 'pai' do terror cósmico, conhecido por criar alguns dos livros de horror mais consumidos e premiados até hoje. 

Apesar da criatividade, H.P Lovecraft era ferrenho racista e xenofóbico, mas diferente do que muitos pensam, no caso do autor, a tarefa de separar sua obra de sua visão pessoal se torna  impossível, tendo em vista que toda mitologia criada em seus livros, é baseada em estereótipos raciais. 

Retrato de H.P Lovecraft / Reprodução

Até mesmo para sua época, em seu círculo de amigos, Lovecraft, não era visto com bons olhos por suas atitudes preconceituosas, mas mesmo assim, seus livros nunca foram retirados das prateleiras e o autor apenas ganhou a fama e prestígio após sua morte.

Quando o autor contemporâneo Matt Ruff, que também é um escritor branco, notou a oportunidade de subverter as visões de H.P Lovecraft e escancarar as visões deturpadas do autor, nasceu Lovecraft Country, que contava a história de um jovem negro chamado Atticus Freeman e suas aventuras ao lado de sua intrigante namorada Letitia e seu sábio Tio George em uma região Lovecraftiana, baseada no universo de Lovecraft.

A série da HBO Max segue a mesma premissa dos livros, porém, com acréscimo de questões raciais ainda mais relevantes e eventos históricos da vida real que aconteceram nos Estados Unidos. Das Sundown Towns ao Massacre de Tulsa e o trabalho de artistas como do fotógrafo e cineasta Gordon Parks, Lovecraft Country resgata a memória, convenientemente apagada, de como era a vida da comunidade negra nos EUA nas décadas de 50 a 60. 

Leti e Tio George / HBO Max

Com direção de Misha Green e produção de Jordan Peele, a série acompanha Atticus e sua família, que partem para uma viagem pela América a fim de encontrar a localização de Montrose Freeman, pai de Atticus, mas no caminho, se deparam com criaturas misteriosas, sociedades secretas e pessoas tão piores quanto qualquer criatura que eles possam vir a encontrar.

Confrontados pela população americana branca e racista, o protagonista e sua família tentam sobreviver no país que tenta a todo segundo acabar com suas vidas. A série mostra de forma poderosa e nada sutil, os efeitos das leis de Jim Crow, conhecidas como leis de segregação que continuavam em vigor na América, principalmente durante a década de 50 e que até hoje causam consequências para a comunidade negra.

Lovecraft Country triunfa ao trazer à tona casos de racismo e segregação da vida real que foram apagados da história americana, assim como evidências de diversos crimes contra a comunidade negra, que apenas há poucos anos atrás foram desvendados. 

Dora Freeman, falecida mãe de Atticus/ HBO Max

Mas nem apenas da análise sobre o racismo estrutural respira a série, pois ela também explora os grandes feitos da comunidade negra, principalmente seu pioneirismo, que também foi apagado pela história, mas aos poucos vem sendo resgatados através de filmes e séries como Watchmen e Lovecraft Country.

Além de homenagear nomes importantíssimos como Sister Rosetta Tharpe, a 'mãe' do Rock' n' Roll e Jack Roosevelt "Jackie" Robinson, que foi o primeiro jogador de beisebol negro da história, a série também, por meio de símbolos, também traz referências à outras figuras como o criador do Green Book, que na série é representado pelo Tio George, o escritor francês Alexandre Dumas, Prince Hall Freemasons, que foi uma sociedade secreta negra da vida real e a grande poetisa, Sonia Sanchez.

As homenagens não ficam apenas no passado, como também abordam presente e futuro, trazendo uma bela visão de afrofuturismo através da personagem Hippolyta Freeman. Vale lembrar que no afrofuturismo, mais do que representar um movimento artístico, ele aborda questões sociais e culturais combinando elementos da ficção científica com história e fantasia para representar dilemas da comunidade negra e questionar eventos históricos, trazendo a figura do negro como um viajante pelo tempo e espaço.

C'Est, personagem inspirada na cantora Elza Soares / HBO Max

Com tecnologia avançada ao seu lado, como visto no sétimo episódio da temporada, "I Am", o afrofuturismo explorado em Lovecraft Country busca a ressignificação do papel dos negros, principalmente da mulher negra, na sociedade, na ciência e na evolução. 

Lovecraft Country também aborda, mesmo que de forma rápida outras questões relacionadas à guerra, principalmente representando outros povos que sofreram violência por parte dos Estados Unidos, incluindo indígenas norte americanos e coreanos durante a guerra.

Em "Meet me In Daegu', o sexto e um dos mais importantes episódios da primeira temporada, acompanhamos a guerra entre os Estados Unidos e Coréia pelos olhos de Ji-Ah, uma jovem estudante coreana de enfermagem que sonha em conhecer a América e as celebridades de Hollywood.

De forma sensível, o episódio não apenas resgata a memória da guerra pela visão de quem teve parte de seu país destruído na guerra, como também explora conflitos políticos atrelados à intrigantes criaturas da mitologia coreana, essencialmente deixando nítido como a representação de minorias como 'monstros', é figura presente nos livros de Lovecraft e no imaginário norte americano.

"Meet Me in Daegu' / Lovecraft Country

Apesar da importância de demonstrar os erros do passado, a violência da trama pode afastar públicos mais sensíveis à temática sangrenta, porém, para fãs de horror, principalmente horror cósmico, é um prato cheio de referências de cultura pop e cenários históricos muito importantes. 

Não é uma série fácil de ser digerida, principalmente pela forma que narra os acontecimentos da vida real , mas Lovecraft Country se mostra extremamente essencial em tempos de Black Lives Matter e protestos que tem acontecido nos últimos meses.

Séries como Lovecraft Country e Watchmen desmontram a necessidade de produções que não apenas mostrem a dor da comunidade negra, mas que também tragam justiça à memória de todos que se foram e daqueles que ainda lutam por um lugar ao sol. As duas séries podem ser assistidas na HBO e HBO Max, que chega em breve ao Brasil. 

Nota: 10/10 

'Queer Coding' e a verdade sobre vilões LGBT no entretenimento



Por Victoria Hope

Já se perguntou o motivo pelo qual você ama vilões e muitas vezes consegue se identificar mais com eles do que com os heróis das tramas? Se você for LGBT, com certeza se identifica ainda mais, porém existe um motivo real por trás disso e vamos falar dele por aqui.

Existem centenas de artigos, matérias e editoriais inteiros falando sobre o problema de tantos vilões, principalmente de mídias infantis como animações, serem sempre retratados com 'traços gays', numa tradução livre do termo. 

Por um lado, é triste pensar que muitas crianças LGBT se veem nesses vilões que foram escritos justamente como chacota, como formas de 'envergonhar' todo o grupo, afinal, os vilões representam o mal e muitas vezes isso pode acabar associando a imagem de LGBTs com um desejo pelo perigo ou por burlar a lei. 

Isso tudo é verdade, mas tem um lado que talvez muitos não saibam. Grande parte dos vilões 'queer coded' de estúdios como a Disney, por exemplo, eram desenhados e escritos por artistas LGBT dentro da indústria, que achavam no vilão, a única forma de inserir uma pequena 'representatividade' ali. 

Úrsula de 'Pequena Sereia' / Disney

Foi o caso de vilões como a icônica Úrsula de 'A Pequena Sereia'. A personagem foi desenhada em homenagem à drag queen Divine, que muito antes do filme, era uma grande amiga de Howard Ashman, que fazia parte da equipe de produção do filme e escreveu as músicas de toda a animação, além de Rob Minkoff, que também conhecia a performer da cena noturna LGBT.

Essa foi uma forma de ambos inserirem uma figura divertida e muito importante para o grupo, sem que isso ficasse nítido para a audiência leiga. Naquela época, quem era adulto e LGBT com certeza reconheceu a figura, mas as crianças e seus pais provavelmente não reconheceram.

Muitos sabem que os estúdios queriam o efeito contrário. Na trama, personagens como Scar, Úrsula, Hades entre muitos outros, estavam ali para representar o mal, a traição, 'coisas' que deveríamos 'abominar', mas o 'problema' é que não foi isso o que aconteceu.


Equipe Rocket de Pokemon / Cartoon Network
O que era pra ser um ataque à indivíduos da comunidade LGBT, teve efeito contrário, pois rapidamente esses vilões se tornaram um 'espelho'. Toda estética e estilo de vida desses personagens evocava uma aura de poder, unido à roupas espalhafatosas e personalidades fortes, onde esses antagonistas ignoravam as regras ditadas pela sociedade.

Ser um vilão, significava rejeitar completamente todos os dogmas e conceitos daquela sociedade para viver à sua maneira e isso é algo que todos os vilões pregavam, logo, o público marginalizado, desde a infância, passou a se identificar com esse conceito.

Em um dos nossos artigos, já comentamos a importância de crianças se verem na mídia e mesmo que vilões LGBT não sejam a representatividade ideal, é impossível dizer que essas crianças não se sentem representadas e 'empoderadas' por esses personagens.


Catra e Adora de 'She-Ra' / Netflix 
Ao invés do público rejeitar esses vilões, eles os abraçaram, se sentiram acolhidos por essa representatividade, por mais 'negativa' que ela fosse. A maioria dos vilões de animação e filmes não possuem características que possa os redimir, mas esse é o ponto, um vilão não precisa ter um arco de redenção e é nessa hora que surge a importância da separação entre vida real e ficção. 

Catra, por exemplo, na nova versão de She-Ra, continua sendo a vilã e mesmo que nós tenhamos certa 'empatia' por ela, em nenhum momento a animação protege a personagem das coisas erradas que ela faz, muito pelo contrário. 

Claro que temos um primeiro momento onde ainda vemos que ambas Catra e She-Ra nutriam uma amizade a conforme a trama engrossa, notamos que Catra sente algo além de amizade pela protagonista, mas esse amor logo se torna 'raiva' e por ser rejeitada desde nova, a vilã tenta de todas as formas agradar os vilões para 'ter um lugar ao sol'. 


Loki, Ozymandias e Mística / Marvel | DC Comics | Marvel

Nem sempre vilões queer-coded eram LGBTs, mas alguns eram abertamente não-héteros nos quadrinhos, por exemplo, e muita gente cresceu lendo e se identificando com esses personagens, como Loki de Thor, o Ozymandias de Watchmen e a própria Mistica de X-Men (além de uma série de outros personagens da saga). 

É importante lembrar que nem todos amavam esses personagens e grande parte desses antagonstas possuía requintes de crueldade e é aqui onde mora o perigo de colocar todos os vilões ou os principais vilões e anti-heróis como LBGTS. 

Quando essa 'demonização' se torna um padrão para a representatividade na mídia, sem que haja uma representação LGBT positiva e genuinamente 'heróica', a tarefa de fazer com que pessoas não LGBTs simpatizem mais com os personagens e pessoas assim, se torna bem mais difícil. 

Coringas / DC Comics 
Quando falamos em queer-coding e quadrinhos, é impossível não falar dele, o Coringa, um dos vilões mais amados e simultaneamente odiados pelos fãs de HQs e cinema. Um dos personagens mais complicados e assustadores na história da DC, tem uma origem que é um mistério, mas isso não faz dele menos 'icônico'.

Vale lembrar que icônico aqui é usado como forma de dizer que ele se tornou um ícone para a mídia, o que não deixa de ser verdade. Assim como seu arqui-inimigo, Batman, Coringa teve diversas interpretações no cinema e na televisão, ganhando até seu próprio filme de origem ano passado.

O primeiro ator a interpretar o Coringa, foi Cesar Romero, um ator cubano e gay, que em sua juventude foi considerado um verdadeiro galã. A risada icônica que conhecemos partiu dele, assim como a atitude do personagem.

Cezar Romero  na juventude / Cezar na série clássica de Batman em 1966

Em um trecho de uma rara e antiga entrevista, há uma fala do ator (Cesar) dizendo que interpretar Joker na primeira adaptação dos quadrinhos em 1966 foi algo muito importante, pois ele finalmente poderia agir de forma mais livre e 'raunchy' (termo usado para dizer atrevido (a). Confira o vídeo.

O Coringa dos quadrinhos sempre foi representado como uma figura espalhafatosa, dramática e exagerada; um vilão sempre era visto como apaixonado pelo arqui-inimigo Batman, porém essa paixão era doentia. 

Em nenhum momento dos quadrinhos ou das adaptações do personagem, as ações do Coringa foram redimidas, muito pelo contrário. Somos levados a amar e odiar o personagem ao mesmo tempo, assim como temê-lo por ser uma figura completamente imprevisível e fascinante. 

Joker / Warner Bros.

Para fechar essa análise, não poderia deixar de falar sobre o Coringa vencedor do Oscar em 2019, interpretado por Joaquin Phoenix. 'Mas Vicky, esse Coringa era hétero, ele perseguiu a menina'. Sim, ele fez todas essas coisas, mas se lembra do comecinho desse texto, onde comentamos que nem sempre vilões queer-coded eram LGBTs?

Em uma conversa com Charles Pullman, editor do I9 Gizmodo, falamos sobre o Coringa e sobre Cesar Romero, Heath Ledger e por fim, Joaquin Phoenix. Enquanto conversávamos, surgiu algo como 'Você também sentiu queer codes no novo filme do Coringa?'

Rimos inicialmente, mas depois paramos para analisar todo o filme. Olhando pelo lado de fora, Arthur era um stalker, ele tinha 'fantasias' com aquela mulher desconhecida, mas ao mesmo tempo, de forma extremamente subjetiva, a trama (ou o próprio Joaquin), uniram a questão de saúde mental do personagem, junto com a seu comportamento violento e por fim, sua inabilidade em performar a masculinidade tradicional para criar essa 'persona'.

Joker / Warner Bros. 
Queer coding não é apenas sobre a sexualidade dos personagens, aliás, muitas vezes não é sobre isso, é sobre a performance, os gestos, trejeitos estereotipados que a sociedade heteronormativa vê dentro da comunidade LGBT (sem conhecê-la, vale ressaltar).

Em 'Coringa', acompanhamos a evolução de um rapaz fisicamente e emocionalmente fragilizado para um vilão que se empodera através das roupas e da maquiagem. Uma figura espalhafatosa que quer destruir as figuras de poder em questão (leia-se, pessoas ricas de Gotham). 

Notamos em algumas cenas do filme que Arthur se pegava admirando no espelho diversas vezes enquanto aplicava maquiagem; ele era delicado com a arte de se maquiar, diferente de seus colegas de trabalho que só passavam borrões na cara e e mal faziam a barba. 

Cenas deletadas de 'Coringa' / Warner Bros

Arthur tinha uma relação muito próxima à mãe, o que a mídia sempre representou como um sinal de queer-coding, assim como era mostrada a relação entre Norman Bates e sua mãe em 'Psycho'. Em um momento de 'Coringa' quando Arthur finalmente se despe da máscara convencional e se sente seguro, ele dança graciosamente, tal qual um bailarino.

Por fim, quando ele finalmente se 'empodera', Arthur passa a usar roupas berrantes, coloridas, que contrastam completamente com o visual cinza dos patriarcas Murray e Thomas Wayne. Ele se distancia visualmente de ambos os personagens, rejeitando aquele conceito ou 'dogma' da masculinidade e durante sua primeira entrevista, em um momento sua voz falha e ele passa a mostrar seu verdadeiro 'eu'. 

Joker não é gay ou bi, ou melhor dizendo, sua sexualidade é um enigma assim como sua origem desde sua primeira aparição nos quadrinhos, mas pensando em esteriótipos péssimos que sempre foram perpetuados pela mídia, temos uma figura com um pesado queer-code na mídia. 

É impossível se identificar com Joker... Agora, com Arthur Fleck? Talvez, principalmente por ele ser uma figura marginalizada.  Sim, nós podemos nos sentir assim também, mas já está mais do que na hora da indústria incluir representatividade positiva ao invés de adicionar apenas vilões nesse grupo.

Dia Mundial da Visibilidade Trans | Conheça 8 séries e filmes que amamos




Por Victoria Hope


Hoje, dia 31 de Março, é Dia Mundial da Visibilidade Trans, pensando nisso, vamos celebrar os principais personagens trans representados por atrizes e atores trans no mundo do entretenimento, principalmente em filmes e séries.

Representatividade na mídia importa sim e é algo que pode salvar muitas vidas. É impossível ignorar o impacto que se ver representado, principalmente quando falamos em minorias demográficas que mal aparecem em produções da mídia.  

Que a indústria televisiva e cinematográfica aprenda a lição e permita que mais pessoas trans contem suas histórias e vamos além, que elas possam representar suas próprias verdades, mas o mais importante, que sejam respeitadas e tenham condições dignas para trabalhar, se divertir e o mais essencial de tudo, que possam ir e vir às ruas sem medo. 

Vale ressaltar que produções que contam com elencos diversos não apenas expõe a importância de se respeitar as diferenças, como também promove empatia. Afinal, é muito simples para a sociedade em geral demonizar todo um grupo quando não os veem representados ou que quando os veem na tela, sempre notam um teor  negativo relacionado à aquele grupo. 

Top 10 séries e filmes com representatividade trans


#1 Pose (Canal FX) 


É claro que começo essa lista com Pose, série original do FX dirigida por Ryan Murphy, conhecido por sucessos como American Horror Story, Glee e Scream Queens. Pose é a primeira série na história da televisão a trazer uma série com a maior parte do elenco representada por mulheres trans negras da vida real. Na trama, acompanhamos a cena voguing noturna dos Estados Unidos e as dores da comunidade trans na sociedade.


#2 Orange is The New Black (Fox)





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Orange is The New Black marcou história de várias formas, sendo a primeira série a mostrar o dia a dia em uma cadeia feminina, a também promover representatividade LGBT feminina dentro desse conceito de prisão, além de contar com a primeira atriz abertamente trans a participar do grande elenco de uma série mainstream. Laverne Cox, inclusive, foi a primeira mulher trans na história a receber uma indicação de Melhor Atriz Coadjuvante pela série no Emmy Awards.

#3 Climax (Filme)















Lançado em 2018 pelo diretor Gaspar Noé, Climax é um filme pesado francês que mostra as loucuras que acontecem na cena voguing noturna, com 60% do elenco composto por atrizes trans e não binaries, inclusive. Num dia como outro qualquer, um grupo de dança comemora o fim de seus ensaios com uma festinha, mas tudo dá errado quando as pessoas percebem que a bebida da festa foi batizada. A partir daí o filme se torna um completo devaneio, com brigas, ofensas e tudo o que se imagina. Não é um filme para todos os estômagos e pode ser claustrofóbico.

#5 Paris is Burning (Netflix) 
















Um documentário clássico com a temática voguing extremamente importante na história LGBT, Paris is Burning conta a história do nascimento da cena vogue em Paris, onde mulheres e homens trans além de drag queens ferviam na noite e se divertiam para fugir da realidade dura em uma época que infelizmente, assim como hoje, a transfobia comandava as ruas.

#6 Greys Anatomy















Greys Anatomy é uma das produções mais veteranas da televisão e apesar de já ter abordado a temática diversas vezes, mesmo que de forma bem superficial e rasa nos últimos 20 anos, em sua 14ª temporada a série ganhou uma nova adição: Um personagem trans para entrar no elenco da série. Casey Parker é o novo estagiário da clínica e revela ser um homem trans na trama. O mais legal é que o personagem não é reduzido apenas à sua identidade, pois ele é um personagem bem complexo e que tem como foco ajudar a salvar vidas ao lado da Doutora Grey.


#7 O Mundo Sombrio de Sabrina (Netflix) 















É sempre bom ver quando séries adolescentes trazem representatividade e O Mundo Sombrio de Sabrina da Netflix não foi diferente. Além de apresentar personagens LGBT, incluindo pansexuais, como o primo de Sabrina, a série foi a primeira na história a trazer um ator não binárie para representar um personagem trans na trama. Lachlan Watson é o ator não binárie da vida real que interpreta Theo, um garoto que ainda está descobrindo sua identidade trans na série e segundo o próprio ator, ele queria ter visto uma representatividade assim na adolescência, porque muitos jovens trans e não bináries passaram pela mesma situação que o personagem.


#8  Shameless ( HBO)















Shameless continua sendo uma das séries mais incríveis com representatividade LGBT em geral desde seu lançamento na HBO. Além de contar com dois homens gays como protagonistas, a série foi a pioneira a trazer um homem trans para uma série 'teen'. Trevor apareceu na 7ª e 8ª temporada e também na última que ainda está no ar.