Por Victoria Hope
Durante a Wondecon @ Home desse ano, diversas editoras independentes incríveis participaram da programação virtual e seguindo a tradição do evento, muitas labels que contam com representatividade nas histórias e desafiam conceitos. Uma dessas editora convidadas foi a Kymera Press, que tem como principal foco, enaltecer e divulgar o trabalho de mulheres na indústria dos quadrinhos.
Promovendo quadrinhos com protagonismo feminino e personagens femininas que todos vão amar, a label continua a contar novas histórias e narrativas que encantam não apenas mulheres, mas todos os públicos apaixonados por personagens incríveis, decididas, tridimensionais e poderosas a sua maneira.
Durante a programação, nossa equipe fez uma descoberta maravilhosa: O Brasil está muito bem representado lá fora, afinal, três quadrinistas brasileiras fazem parte da Kymera Press, sendo estas, Amelia Woo e Debora Carita, além de Anna G, que trabalhou com a label no passado em uma série já finalizada. Nossa equipe teve a oportunidade de entrevistar Amelia Woo, quadrinista e arte finalista dos quadrinhos indicados ao Prêmio Bram Stoker, 'Mary Shelley Presents Tales of the Supernatural', além de também ser arte-finalista de Gates of Midnight.
Mary Shelley Presents / Kymera Press |
#1 - Quando você começa um novo projeto, como é seu processo criativo?
Amelia: Depois de conversar com o cliente e estabelecer o público alvo, eu leio o material de referência. Se o projeto já é publicado em outra mídia, eu vejo o material. Se for apenas baseado, eu vejo o material do mesmo gênero e que seja contemporâneo à obra. Também dou uma olhada no contexto histórico em que a obra foi feita e isolo os temas. Formas e cores (quando eu faço as cores também) são baseadas nos temas.
Após a pesquisa, obtendo o contexto, o tema e fazendo um pequeno esquema para adaptar ao projeto, eu parto para a pesquisa visual. Eu também pergunto ao cliente se existe algum “produto concorrente” ou algum outro projeto/produto que os inspire. Tento seguir a visão do cliente, sem perder de vista o que a audiência prefere. Tudo isso me cria uma base de pesquisa para a parte visual. Daí parto para os esboços. Geralmente faço pequenos layouts toscos só para mim, para sentir o ritmo da história. Só então, crio esboços mais elaborados para o cliente. Isso tudo leva em torno de uma a duas semanas para ser feito. O tempo cai para horas dependendo do projeto.
#2 - Quais são suas top 3 quadrinistas favoritas?
Difícil especificar um favorito. Há centenas de artistas que me inspiram e não tenho nenhum específico em mente. As mulheres que trabalham em quadrinhos e ilustrações que me chamaram a atenção nesses últimos meses foram Joëlle Jones, Cassandra Jean e Adriana Melo. Além das minhas camaradas de time da Kymera Press.
#3 - Mary Shelley foi definitivamente um dos grandes nomes da literatura e ela é uma figura muito importante quando falamos em representatividade feminina. Com isso em mente, conte como foi trabalhar em 'Mary Shelley Presents Tales of the Supernatural.'
Admito, foi tenso! Dei o meu melhor sem saber realmente se estava à altura do projeto. Mary Shelley teve uma vida de perdas, mas se manteve firme e transformou o sofrimento em uma criação que ficará para sempre na cultura Ocidental. É inegável o peso do projeto, ainda mais com a adaptação de Nancy Holder e a edição de Debbie Smith, duas veteranas da indústria e literatura.
Meu “monstro” favorito sempre foi a criatura de Frankenstein, então eu tinha uma visão própria do “monstro”, assim como do séc. XIX. Tentei colocar um pouco disso no quadrinho. Felizmente, tanto a equipe quanto a audiência aprovaram.
#4 - O que não pode faltar no seu ateliê?
Meu computador e acessórios, com certeza. Sou uma artista digital (e game dev), o que me torna praticamente uma ciborgue, hahaha. Não faço nada sem meus equipamentos.
#5 - Se você pudesse mandar um recado para artistas brasileiras que sonham em trabalhar com quadrinhos, qual seria?
Garota! Mulher! Moça de qualquer idade. Se você pratica todos os dias e sentiu na pele que era isso que quer fazer pelo resto da vida, faça! Não ouça aquelas histórias bobas sobre “starving artists”. Você consegue viver como uma artista e pagar as contas, ainda mais em Real. Consegue até pagar as contas dos outros! Olha que beleza. Não se preocupe com sua idade, formação acadêmica, se precisa se mudar ou não. Idade avançada? Não subestime o que você consegue fazer em meses. Pouca idade? Ninguém liga.
Se o seu portfolio for bom ou compatível com o que querem, você estará dentro. Formação acadêmica? Não precisa. Antes de terminar meu bacharelado em Artes, eu já trabalhava na indústria. Precisa mudar? Não. A tecnologia está desenvolvida o suficiente para suprir todas as necessidades (envia trabalhos e recebe pagamentos via remota).
Você é mãe ou tem que cuidar de alguém e não tem tempo porque trabalha e cuida da casa? Fique firme e dedique, pelo menos, uns quinze minutos todos os dias para criar algo, seja desenhar ou escrever. Nos primeiros trabalhos, negocie o tempo com o cliente. Se for seu próprio projeto, crie prazos longos para as campanhas, mas não deixe de fazer um pouquinho todos os dias.
Apenas foque no que você gosta de fazer e tente achar uma audiência para isso. E se não conseguir achar em quadrinhos, existem outras mídias na indústria de entretenimento como cinema, games, ilustração, etc. Por favor, não desista de criar algo que é importante para você, não importando quão difícil seja a situação. Não silencie o criador dentro de você.