Por Victoria Hope
Em "Mãos A Obra" drama vencedor do Festival de Veneza na categoria de Melhor Roteiro, Paul era o que podemos chamar de um profissional muito bem-sucedido, pois antes ele era um fotógrafo de renome na França, com dinheiro na conta e uma família bem estruturada, até que um dia decide largar tudo e viver apenas da literatura, mas a escolha infelilizmente traz diversas questões na vida do rapaz, já que seus dois livros fracassaram comercialmente e a partir daí, começa o dilema de sua vida, pois tudo o que poderia dar errado, acontece e sem saída, com um recém-divórcio, sem dinheiro e obras originais recusadas, o protagonista decide tomar uma decisão drástica.
Essa bela adaptação doli vro “À pied d’œuvre”, de Franck Courtès, chega em um momento mais do que oportuno, onde a uberização dos serviços tem se tornado cada vez mais presente na vida dos trabalhadores que se veem sem alternativas em um mundo mais caro e mais hostil a cada badalar do relógio.
O drama, que teve sua estreia no Festival de Cinema Francês desse ano, traz uma visão sobre a ideia de largar tudo para viver o sonho e como ao mesmo tempo, o mundo em si, faz com que pessoas como Paul tentem desistir da liberdade de ser. Conversamos com Valérie, a diretora desse belíssimo longa durante o festival e exploramos as diversas nuances da história desse personagem que ao mesmo tempo parece distante, é extremamente próximo da realidade de toda uma geração.
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| Valérie Donzelli no Festival de Veneza / Foto: Venice Film Festival 2025 |
Amélie Magazine: Parabéns pela vitória de Melhor Roteiro no Festival de Veneza de 2025! Como foi a sensação de vencer esse prêmio?
Valérie: Me senti muito orgulhosa e honrada, mas também feliz, porque vencer um prêmio em um festival traz luz ou um holofote para o seu filme e isso torna mais fácil de pessoas conhecerem seus projetos. porque para fazer existir um filme independente hoje em dia, é algo extremamente difícil. não é sempre fácil.
Amélie Magazine: E qual é o momento de "Mãos a Obra", que você vai levar para sempre em seu coração?
Valérie: Eu simplesmente adorei tudo! Gostei de escrever o roteiro, gostei de filmar, gostei de editar o filme, da montagem também! Todos os momentos foram muito especiais e prazerosos. Difícil, mas muito prazeroso, mas se eu tivesse que escolher um momento para guardar comigo para sempre, seria o final do longa, quando tudo se resolve e nós entendemos que tudo o que Paul escreveu foi inspirado pela vida dele fazendo esses trabalhos e foi isso que entrou no romance que ele está escrevendo nessa história! Esse ponto no filme, ao final, mostra o reconhecimento dos leitores e sobretudo do filho dele também,!
Amélie Magazine: Assim como Paul, muitos de nós já passamos por várias transições de carreira e até mesmo de vida. Isso é algo que ressoa para você?
Valérie: Isso aconteceu comigo com filmes, porque é claro que às vezes não funciona do jeito que você gostaria de funcionasse. Tem momentos onde o dinheiro não entra e a gente precisa dar um jeito, mas ao contrário de Paul, eu tenho uam certa ética e consigo construir meu equilíbrio econômico de tal maneira que eu não preciso fazer os tipos de trabalho que Paul teve que se submmeter para preservar sua liberdade.
Amélie Magazine: O filme nos confronta sobre o fato de que às vezes existe uma solidão quando tentamos alcançar um sonho e isso acontece com o Paul no filme. Poderia falar um pouco sobre isso?
Valérie: A condição na qual ele se encontra, fez com que aos poucos ele deixasse de fazer o que ele fazia antigamente quando ele tinha um trabalho fixo e uma chegada de dinheiro. Ele passa a a abandonar vários hábitos, incluindo deixar de ir ao cinema, deixar de ir à um restaurante, não pode mais receber amigos na casa dele, então pouco a pouco, o mundo dele vai se restringindo mais e mais! Achei muito interessante mostrar ele se tornando meio que um "monge", que corta todas as relações com o mundo para se concentrar no mundo dele que é escrever esse livro, que é esse processo de se restringir e de ficar na solidão. Foi muito interessante mesmo.
Amélie Magazine: Vamos voltar no tempo. Se você pudesse voltar ao passado e deixar uma mensagem para a pequena Valérie que nem imaginava que se tornaria uma diretora premiada que teve a oportunidade de vir ao Brasil, qual seria esse recado?
Valérie: Eu diria para ela seguir o que ela sente, siga seu coração, siga suas convicções, porque isso é o que eu sempre fiz. E eu também diria para ela que seria melhor ela também se tornar produtora (risos)!
Amélie Magazine: E qual é o seu momento favorito do livro que você conseguiu adaptar para esse filme?
Valérie: A cena do animal! Adorei transcrever essa cena!
Amélie Magazine: Uma mensagem para os brasileiros que vão assistir ao filme durante o Festival de Cinema Francês nesse ano?
Valérie: Eu diria aos brasileiros que essa é uma história de certa forma universal, porque esse fenômeno da"uberização" da sociedade é algo que tem acontecido no cenário mundial e todo mundo em algum momento da vida pode ser confrontado com essa situação, então esse sentimento de se identificar com o Paul é totalmente universal, porque pode acontecer a qualquer momento. E é importante ver como as pessoas conseguem lidar com as necessidades financeiras e ao mesmo tempo, lutar para eles conseguirem ser as pessoas que eles projetam ser.
Querem ter uma família ou querem ficar sozinhos? Querem escolher um trabalho ou outro? Se quisermos seguir um caminho na vida, precisamos combinar essas necessidades financeiras da vida com o que as pessoas pretendem fazer de suas próprias vidas, afinal, são escolhas que só cabem a elas.

