Por Victoria Hope
Contratempos, filme de Eric Gravel que concorreu ao Festival de Veneza 2022 e levou para casa os prêmios de Melhor Direção para Gravel e de Melhor Atriz por Laura Calamy, conta a história de Julie, uma mulher que luta sozinha para criar seus dois filhos no subúrbio e manter seu emprego em Paris.
Quando ela finalmente consegue uma entrevista para um cargo correspondente às suas aspirações, uma greve geral eclode, paralisando o transporte. Ela então embarcará em uma corrida frenética para salvar seu emprego e sua família.
Assim como em projetos como Crash Test Aglaé, filme anterior de Gravel, Contratempos explora as alegrias e tristezas das pessoas em relação ao mercado de trabalho e tudo que entra em jogo quando nos dedicamos a nossa profissão e deixamos de seguir sonhos. Mas quem disse que é tarde demais para conseguir a carreira dos sonhos? Essa é a grande mensagem do longa.
Contratempos / Foto: Festival Varilux |
Amélie: Como foi a criação da personagem Julie?
Eric: Eu não queria que ela fosse uma personagem comum, então fui criando essa personagem que é mãe, mãe solteira e que precisa ir trabalhar, ou seja, ela não tem muito espaço para se manifestar e pra fazer reinvindicações, como vemos no cenário do filme, porque ela tem obrigações e é por isso que ela leva esse estilo de vida.
Então ela é uma personagem que vive de modo 'a parte' e de certo modo 'banal', bem comum na verdade. Aos poucos vamos introduzindo novas informações para essa personagem, mas de forma gradual para que a grande revelação fosse uma surpresa. Ela é uma mulher, ela é camareira em um hotel, só que ela tem um diploma e agora está tentando retomar um status que ela perdeu.
A gente vive numa sociedade que tenta muito guardar o status que está perdendo, mas ela não, ela está tentando voltar pro estilo de vida que ela perdeu.
Amélie: Em filmes como seu projeto anterior Crash Test Aeglé, você também explora a relação dos trabalhadores com seus empregos. Esse é um tema que você gostaria de explorar mais em outros filmes?
Eric: O que me interessa é abordar as relações que nós temos com o trabalho, como isso nos define e como nós vivemos isso. Tanto que Julie, não vemos muito do trabalho dela, mas sim a forma que ela lida com esse trabalho; evidentemente, a vida dela gira em torno do trabalho e isso é uma coisa muito comum.
Fiz um paralelo com meu pai, porque vivi com um pai solteiro, sem minha mãe estar por perto. É um caso meio único, mas parecido com a história de Julie e vi muito meu pai sofrer com essa questão do trabalho, foi muito difícil para mim (como criança). Eu me perguntava se o trabalho também seria jogado nas minhas costas quando eu crescesse ou se eu poderia escolher, acho que é por isso que gosto de ser diretor (risos).
Amélie: Os últimos minutos do filme foram bem catárticos com uma atuação primorosa de Laure. Poderia falar um pouco mais sobre isso?
Eric: Do começo até o final foi tudo muito similar. A Laura é muito perfeccionista, muito trabalhadora e de uma certa maneira, me identifico muito com ela. É engraçado que voltamos a sua pergunta da relação das pessoas com o trabalho, já que ela também sempre estava trabalhando, trazendo ideias e novas formas de entregar as cenas, ao longo do trabalho, foi um processo muito agradável.
Ela é muito agradável como pessoa, é muito fácil de trabalhar com ela, então que seja no final ou seja no começo, foi tudo muito fácil de alcançar com ela. Falando mais sobre a personagem, gosto de criar personagens femininas como em Crash Test. Tenho esse prazer em trabalhar com personagens femininas, então tudo fica mais fácil.