Por Victoria Hope
Kyle Stroud, fundador da Carte Blanche, produtora reconhecida por desenvolver roteiros e combiná-los a elencos e a criadores notáveis, esteve presente na Mostra Internacional de Cinema como parte do Júri, além de trazer três filmes para o festival, sendo eles O Brutalista, da A24, que recentemente foi Vencedor na categoria de Melhor Direção no Festival de Veneza, Harvest e Eeephus!
O primeiro longa-metragem produzido por Stroud foi “Em Busca da Vitória” (2019), de Reza Ghassemi e Adam VillaSeñor e apesar de ter iniciado a carreira como produtor recentemente, já tem um portfólio repleto de produções de destaque, como “Roving Woman” (2022), dirigido por Michal Chmielewski e com produção executiva de Wim Wenders, “Knight of Fortune” e muitos outros
Durante a cobertura da 48ª edição da mostra, nossa equipe teve a chance de falar sobre cinema com o diretor e conhecer um pouco mais sobre os três projetos que ele trouxe neste ano em que visitou o Brasil pela primeira vez.
Amélie: Como é estar aqui no Brasil para sua primeira Mostra Internacional de Cinema em São Paulo?
Kyle: *Risos* Bem, sabe, eu acabei de chegar na cidade, ainda não tive muito tempo de explorar, então eu mal pousei e já vim diretamente para o Festival assistir aos filmes, principalmente porque esse ano faço parte do júri, então estou bem animado. Vou ficar no Brasil por mais de um mês, então estou curioso para conhecer mais coisas
Amélie: Falando em filmes, quais são três títulos que todos apaixonados por cinema precisam assistir pelo menos uma vez?
Kyle: Boa pergunta! Eu amo "Paris Texas" de Wim Wenders, é um dos meus filmes favoritos de todos os tempos e é de quebrar o coração. Eu também amo "Stalker" de Andrei Tarkovski, amo muito e talvez, "Werckmeister Harmonies" de Béla Tarr e Agnes Hranitzky.
Amélie: Você trouxe três filmes para a Mostra este ano, sendo eles, O Brutalista, Harvest e Eeephus. Com isso em mente, quais são seus elementos favoritos em cada um desses títulos tão diferentes?
Kyle: Eles são todos tão distintos e projetos de arte bem singulares. "O Brutalista", por exemplo, é um enorme épico, filmado em 70 mm, foi feito de forma independente, impresso em um filme de 70 mm mesmo e essa foi a versão exibida em Veneza e quando ele for lançado oficialmente, terá mais algumas cópias em 70mm, mas além dessa parte técnica, eu acho que é uma baita carta de amor ao cinema, dos tipos de filmes que não temos mais hoje em dia;
Realmente traz a sensação de um épico, com uma intermissão, cartões de títulos, assim como os grandes clássicos, sabe? Agora, Harvest é um filme de Athina Rachel Tsangari e esse é o primeiro filme não-grego dela. Ele foi filmado na Escócia e tudo aquilo foi criado do zero, toda a vila e todos os cenários foram construídos exclusivamente para o longa e também temos Sean Price Williams como diretor de Fotografia, ele fez Good Time, da A24, o que também foi interessante.
Athina queria criar um personagem que parecesse ter saído diretamente dos anos clássicos e aqui ele foi interpretado pelo Caleb Landry Jones e o personagem dele aqui é meio 'odiável'., quase não tem qualidades que outros admiram. Ele é meio covarde e por incrível que pareça, eu me identifico com ele, não no sentido da covardia, mas esse personagem meio 'estranho', isso eu consigo relacionar *risos*
Mas falando sério, o personagem dele é fascinante e Caleb é um ator tão fantástico e dentre todos os personagens do filme, ele é justamente aquele que não tem características heróicas, assim como os outros, então você meio que acompanha ele e as outras pessoas como se fossem indivíduos em meio ao caos.
E por fim falamos de "Eephus". Esse filme é dirigido pelo Carson Lund e ele faz parte de um coletivo chamado Omnes Films, o que é bem interessante. O orçamento para os filmes é pequeno, mas agora eles estão procurando por novos títulos também para financiar através do coletivo. É algo muito legal, porque todos eles são diretores muito novos de New England, mas alguns também são de Los Angeles, enfim, eles são alguns dos maiores cinéfilos que você irá conhecer, são completamente apaixonados por filmes, ou seja, eles praticamente comem, dormem e respiram cinema *risos*
E com "Eephus", Carson queria criar algo diferente e pra mim me lembra algo bem reminiscente de Linklater, sabe? Da forma em que você não tem um protagonista central, então você meio que se sente como uma mosca na parede, observando tudo o que está acontecendo com esses personagens e mais uma vez, esse é o tipo de história que não vemos tanto mais hoje em dia, onde você não precisa ficar seguindo um único protagonista e sim onde observa o grupo inteiro de personagens muito interessantes, então nos identificamos com suas ansiedades e seus medos e tipo, eu não sou fã de esportes, mas mesmo assim achei muito com o que me identificar em relação a esses personagens e as realidades deles. Nesse filme, você vê muitas pessoas que com certeza já conheceu na vida real!
Harvest / Foto: Mostra de Cinema Internacional |
Amélie: Digamos que você tem o poder de viajar no tempo. Se pudesse encontrar o pequeno Kyle, o que diria para ele. E outra coisa, ele acreditaria que você trabalha com filmes hoje?
Kyle: Definitivamente não acreditaria! *risos* Eu abandonei a faculdade de Cinema, duas semanas antes da minha formatura. Eu estava dirigindo meu primeiro curta da minha tese e eu estava já em produção, com elenco completo e já tinha filmado quase tudo. Eu tinha três dias restantes e um amigo meu havia sido financiado completamente, com um filme sobre boxe, então, eu tinha oportunidade de terminar meu filme, mas aí apareceu essa oportunidade incrível de produzir esse projeto de longa metragem do meu amigo, o que pareceu uma oportunidade incrível.
Acreditei nele e acreditei nesse filme e na direção dele e a na codireção de outro amigo nosso e esse foi o meu salto e dali eu comecei a ser recomendado pra produzir outro filme e depois outro filme e por aí vai, gosto de dizer que fui como um Tarzan de galho em galho *risos* sendo os galhos, os projetos que foram aparecendo. então depois de dizer tudo isso, eu acho que diria para o meu eu mais novo: Não desiste, continue seguindo em frente. Faça as coisas que te dão medo, como por exemplo, uma vez conheci Brady Corbet na festa da A24 e eu fiz contato com ele por lá dizendo diretamente que eu queria trabalhar com ele e que eu queria trabalhar com "O Brutalista"e eu consegui essa oportunidade.
O mesmo aconteceu com "Harvest"; eu gosto de contatar as pessoas com as quais eu adoraria trabalhar nos projetos, esse contato cara a cara é muito importante, por isso é preciso não ter medo, então eu diria isso pra o pequeno eu.
Amélie: Se pudesse dar um conselho para pessoas aspirantes que sonham em trabalhar na indústria cinematográfica, qual seria?
Kyle: Vou comentar o que disse durante um Festival de Los Angeles na semana passada, você precisa botar a cara no sol. Você precisa aparecer, é importante sim escrever seu roteiro e continuar criativo e botar a mão na massa, mas mais importante do que isso, é ser sociável, conhecer pessoas novas. Você precisa sim ter ambas habilidades, tanto a social quanto a criativa para se encontrar no local certo, na hora certa e colocar sua arte na frente das pessoas certas.
E o básico, é claro, assista filmes, estude cinema, não fique apenas no superficial. Continue trabalhando no seu projeto, mas também não seja muito precioso com seu trabalho. Eu sei que é difícil, mas deixe as pessoas experientes mexerem no seu trabalho, aceite conselhos e não acredite que sabe tudo. Seja humilde, mas também continue fiel a sua ideia, mas saiba dividir com as pessoas certas.
Eu vou para o Festival de Cannes ou Sundance, por exemplo, mesmo quando não tenho nenhum filme para lançar, porque eu adoro conhecer pessoas novas, projetos novos e me conectar com novas pessoas que podem, mais pra frente render parcerias. Como produtor, isso é muito importante para mim, eu preciso estar onde as mentes criativas estão e preciso conhecê-los.
Lá nos festivais você pode encontrar diretores para seus projetos, atores, roteiristas ou quem sabe, até mesmo financiadores. Mandar emails frios não leva a lugar algum, agora, criar conexões genuínas com outras pessoas nesse ambiente de festivais, é o que vai fazer seu projeto acontecer de fto.