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Sundance 2022 | Entrevista com Gabriela Ortega, Shakira Barrera e os produtores brasileiros de Huella

 

Por Victoria Hope

Nessa sexta (21) nossa equipe teve a oportunidade de bater um papo com a diretora Gabriela Ortega, a atriz Shakira Barrera (Glow) e os produtores brasileiros Helena Sardinha e Rafael Thomaseto sobre 'Huella', curta de temática sobrenatural que compõe a lista oficial do Festival Sundance desse ano, que acontece até o dia 30 desse mês de forma virtual.

Em Huella, acompanhamos Dani, uma atendente e dançarina que se vê em meio a uma maldição familiar após o falecimento de sua avó. Com a temática de trauma geracional e uma nova visão sobre as cinco fases do luto, o curta demonstra como cabe as mulheres mais jovens das famílias, quebrarem o ciclo de trauma e violência, ao mesmo tempo em que celebra a união e a importância do apoio das mulheres da família, que no fim, sempre apoiam umas as outras nos momentos de necessidade. 

Através da dança, notamos nossa protagonista aos poucos deixar as amarras da maldição ao entender que a presença do espírito de sua avó não quer lhe causar mal, mas sim, fortalecê-la para que ela não sofra da mesma forma que sua abuela, suas bisas e suas tias avós sofreram por gerações.

Huella / Foto: 271 Films

Confira a entrevista:

Amélie: O que a inspirou a criar a história de Huella?

Gabriela: Acho que muitas coisas vieram ao mesmo tempo que evoluiu para o que se tornou hoje, mas a semente nasceu a partir da minha própria família, que é da República Dominicana, com muitas mulheres e suas histórias de pessoas que vieram de cidades pequenas e meio que a relação delas com os homens de suas vidas. 

Elas são lutadoras, mulheres que quebraram o 'molde', mas elas não veem isso; eu vejo porque somos daquela geração onde podemos ver o passado refletir no futuro um pouco mais e para elas é como elas trabalharam duro em toda sua vida. Eu queria honrar isso, de que ser um imigrante, é um sacrifício e você acaba tendo que fazer escolhas, passar um tempo com sua família ou seguir seu sonho.

Eu sou aquela que sempre teve pensamentos conflituosos quanto a isso, porque eu sou aquela que pode fazer isso agora, diferente da minha mãe ou da mãe dela. E eu queria mostrar que as vezes, essa responsabilidade (de quebrar o ciclo) é tão pesada e como nós não queremos carregar os traumas de gerações passadas. 

Amélie: Primeiramente, parabéns pelo seu trabalho incrível e pela dança. Em algum momento você conseguiu se ver na protagonista Dani? 

Shakira: Muito obrigada pelo elogio e sim, eu consegui me ver muito na Dani. Antes de tudo, fiquei honrada e lisonjeada em ser chamada pela Gabriella para interpretar a personagem. Na primeira vez em que li (o roteiro) e vi a dança flamenca, fiquei encantada porque esse foi um desafio tão incrível.

Eu sou uma dançarina, danço desde os meus 3 anos, então unir atuação com dança em um curta em apenas 4 dias, foi fantástico pra mim porque eu amo trabalhar sob pressão e também tem essa confiança que você mergulha quando entra em um projeto, na verdade todos nós mergulhamos e tanto Helena e Rafael foram maravilhosos; olhe para nós hoje,  estamos aqui no Sundance.

Huella / Foto: 271 Films

Amélie: Quais foram os maiores desafios nas filmagens desse projeto? 

Helena: Acredito que nem preciso dizer, mas o Covid-19 foi um desafio para muitos produtores, mas acho que fora isso, tivemos um espaço muito curto de tempo para produzir Huella, tínhamos apenas uma espaço de três semanas de preparação e logo depois já partimos para as filmagens para a première.

Tudo aconteceu muito rápido, então foi como Shakira comentou, a coreografia entre outras características foram mais difíceis devido a pandemia , então para mim, esses foram os maiores desafios.

Rafael: Acho que uma das coisas que conseguimos realizar muito bem foram as cenas de solo. Levamos três dias e meio para esse feito muito ambicioso. Algumas pessoas não acreditavam que seria possível terminar, Gabriella e nosso Diretor de Fotografia se conectaram muito bem, então isso foi muito importante para nós.

Em determinado ponto podíamos ver que eles se comunicavam apenas por olhares, tomando algumas decisões que estavam na 'mesma página', então tivemos muita preparação antes de chegar a esse ponto e mesmo tempo apenas três semanas, trabalhamos da melhor forma possível para estarmos preparados para possíveis problemas que poderiam surgir. 

No primeiro dia perdemos uma de nossas locações, que foi a cena do telhado, foi quase uma hora e meia perdida e tivemos que realocar, mas no fim encontramos um lugar muito melhor. Como produtores, estamos acostumados a apagar incêndios e com um prazo tão apertado, tivemos que ter certeza de que todos estariam confortáveis.

Amélie: Você se vê como uma pessoa supersticiosa?

Gabriella: Eu me sinto muito conectada com coisas fora do reino físico, não acho que seja algo supersticioso necessariamente pois sou uma pessoa espiritualizada, digo, cresci em ambiente católico, não que eu siga a religião, mas faz parte acreditarmos em algo que não vemos e eu acredito muito no poder das nossas palavras, no poder dos nosso ancestrais e daqueles que vieram antes. Acredito que seria egoísta pensarmos que nós somos os 'todo-poderosos', então me sinto muito conectada definitivamente com algo maior do que eu e isso me dá forças para continuar criando e honrando minhas raízes.

Amélie: Como você se sente sobre trauma geracional e quebrar ciclos? 

Shakira: Wow, eu adoro falar de forma aprofundada sobre trauma geracional. Como uma mulher em meus 30 anos, é sobre isso, sabe? Quando você está com 20 anos e tem esse ego de pensar 'eu posso fazer tudo', 'estou pronta para dominar o mundo', mas aí percebe que tem muitas crenças que te limitam, que foram impostas seja pela casa, enquanto você crescia, sua mãe e seu pai, seus irmãos ou o seu ambiente, então no meu caso, eu estava dissecando meus próprios traumas, minhas próprias crenças limitadas durante as filmagens, então honestamente, (a arte) imitar a vida é um processo tão enriquecedor.

É você olhar para dentro de si mesmo e pensar  com quais histórias você tem se alimentado, por exemplo, coloque uma medida, há quanto tempo você tem se alimentado dessas histórias de não ser bom o suficiente? Essa história que você tem se contado desde quando tinha sete anos, é hora de deixar essa isso pra trás. Isso é o que é bom sobre arte, algo que queira me fazer trabalhar com tantas mentes criativas como Gabriella, Helena e Rafa. Nós todos temos a mesma forma de ver a vida e arte, então para mim foi uma bela experiência.

Huella / Foto: 271 Films

Amélie: Como é fazer parte do Sundance esse ano?

Helena: Acho que é o sonho de todo cinegrafista. Sempre foi o meu sonho desde quando comecei a trabalhar com cinema, ter um filme lá. Como Shakira comentou, temos pensamentos que nos limitam como 'você nunca vai chegar lá, esse sonho é grande demais pra você', mas (estar aqui) é bom demais, digo, nós trabalhamos para isso, todos nós aqui trabalhamos muito para isso. 

Sinto que é um momento ótimo pra que mais coisas (boas) venham. Estou muito orgulhosa de nós, de toda nossa equipe por termos chego até aqui e Gabriella tem fortalecido esse sentimento com a Shakira, então estou muito animada para o que vem a seguir nesse ano.

Rafael: Eu acredito que muitas vezes na jornada de um artista, você precisa de uma aprovação para ter confiança e continuar seguindo em frente com sua arte e sendo um grande fã do Sundance desde sempre, na realidade, fui voluntário no Festival por três anos consecutivos, então particularmente, voltar ao evento como Produtor de um Curta Metragem.

Ainda mais com uma equipe enorme da comunidade latina, (trazendo) um filme que é bilíngue, em inglês e espanhol, eu sinto uma honestidade enorme nisso. Sou grato por fazer parte da família Sundance e abrir portas para novos criadores

Amélie:  Para fechar o papo, se você pudesse mandar uma mensagem para mulheres que sonham em se tornar diretoras, qual seria? 

Gabriela: Não tenha medo de quebrar algumas regras, siga sua intuição e saiba que, as vezes, não é sobre pedir um lugar na mesa, mas sim sobre fazer a mesa e trazer pessoas que realmente acreditam em você para essa mesa. Siga em frente e não internalize os pensamentos limitadores, como Shakira comentou.

Só porque as pessoas tem uma imagem de você, não quer dizer que você precise pegar essa imagem para si mesmo. Não esconda quem você é e sua cultura, porque isso faz de você uma pessoa especial e única. 

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